25 de janeiro de 2010

A “morabeza” moçambicana

Elson Lopes
Itoculo


Chegando a Matupo, estive 4h sentado, sem poder fazer nada (mesmo as necessidades fisiológicas da nossa natureza humana) por causa de não roubarem a mala.
Quando passava para a sala de espera apresentei a minha mala de mão para revistarem. Entretanto, o senhor que estava a revistar encontrou um frasco de perfume e começou e resmungar que não podia passar com aquilo. Expliquei-lhe que era pouca quantidade e que deixaram passar em Portugal. Ele respondeu: “aqui não é Portugal, é Moçambique”. Depois de tudo disse-me que podia passar mas tinha que dar um “refresco”. Como não sabia o verdadeiro significado de “refresco” aqui, perguntei-lhe se queria cerveja, ele disse não. Disse: então vou comprar sumo, assim fiz. Quando cheguei contei o sucedido ao senhor padre Damasceno e ele riu-se. Não compreendia o porque do riso. Depois diz-me: o “refresco” que o senhor pediu não era sumo mas sim dinheiro.


No avião para Nampula vinha ao meu lado uma criança desembaraçada e esperta, falava bem o português. Durante o voo ela pôs-se a falar comigo fazendo perguntas. Quando nos serviram o lanche (eu já estava com fome) mas ela não quis comer o seu lanche. Então perguntei porque não comia, ela respondeu dizendo que guardava para oferecer ao pai que estava a sua espera em Nampula. Perguntei-lhe se não queria ficar grande como a mãe (que estava do outro lado) ela diz-me que sim e eu disse: então tens que comer. Ela concordou comigo mas comia só uma parte e a outra guardava para o pai.
Conto-vos estas histórias para verem que devemos ser como crianças, como diz o evangelho. Apesar do sucedido na primeira história, aqui quem tem, partilha com o outro, como que é obrigado. Isso é muito bom apesar de favorecer a preguiça.
Uma das coisas que me impressionou também é a “morabeza” (bem acolher) que se vive aqui.

Nas celebrações dominicais almoçamos sempre nas comunidades onde celebramos. Servem-nos sempre o melhor que têm e que podem. Mal a equipa missionária chega, ficam preocupados com o que vão servir e alegres pela nossa presença, sobretudo do padre porque assim vão poder confessar e comungar (maioria das vezes não sabem que vamos porque é surpresa para vermos como anda o funcionamento das comunidades visto que passam meses e meses sem ninguém da equipa passar lá).
Aqui, e não só, há sempre a preocupação de dar algo de comer ao visitante. Quando o visitante rejeita ficam tristes pensando que o visitante está a armar-se melhor do que eles, não querendo ser como eles, comendo do que eles têm e comem. Deve-se ter um espírito humilde. Sinto-me alegre por estar no meio deste povo.

26 - A alegria completa

– Netia-Itoculo/2003-2004 «Um homem não pode tomar nada como próprio, se isso não lhe for dado do Céu. […] Pois esta é a minha alegria! ...