4 de agosto de 2009

No meio de um povo religioso


Raul Viana

Itoculo



Entre as muitas características deste povo ressalto aqui a sua dimensão crente e religiosa. A partir dos encontros celebrativos que tenho nas comunidades surpreende-me ver a maneira como as pessoas rezam. A simplicidade dos seus espaços de culto e a sua atitude interior de oração manifestam uma convicção religiosa sentida e profunda.

De facto, se olharmos o seu passado e conhecermos a sua origem, vemos que os macuas são um povo religioso por natureza. É interessante conhecer a forma como eles entendem a origem da vida: tudo está ligada ao mito do Monte Namuli, onde se diz que os primeiros homens depois de serem criados por Deus, organizaram uma viagem até à planície, descendo por vários caminhos e, na medida em que se multiplicavam, iam-se separando, dando origem aos diferentes grupos que hoje compõem o povo macua. Para além da descrição criacional, sobressai o conceito basilar do Deus Criador a quem eles adoram.

A crença neste Deus - Ser Supremo - é um elemento importante para a unidade e consistência das suas vidas. Só Alguém Superior pode estar na origem de tudo e para quem tudo deve ser orientado. Assim, toda a sua vida está numa estreita relação com Deus, especialmente nos momentos existenciais mais densos: nascimento, adolescência, casamento e morte.

A religião na sua vertente tradicional está sempre ao serviço da vida, dando-lhe harmonia e consistência. Deus, a pessoa e o cosmo são os elementos existenciais e dinâmicos de uma mesma realidade, onde o sagrado e o profano convivem lado a lado. As práticas de culto, através da mediação dos antepassados, visam obter protecção pessoal e comunitária nas diferentes etapas do ciclo vital. Aí Deus é invocado como o Pai da Vida.

Assim constata-se que o sentido religioso está bem presente neste povo macua, onde Deus faz parte do seu pensamento e das suas preocupações. A negação de Deus seria a negação da própria vida, um negar-se a si mesmo. Um mundo sem Deus não tem sentido, pois só Ele lhe pode dar beleza e harmonia, face a tantas fragilidades vividas no dia-a-dia.

Enfim, constatando esta realidade que me envolve do ponto de vista religioso, a Religião Tradicional é a que sobressai e da qual quase todos participam, mesmo os muçulmanos e os nossos cristãos. Trata-se de uma realidade entranhada na vida deste povo, que não é fácil despir.

Perante esta certeza evidente de um povo religioso e respeitador dos verdadeiros valores da vida, há um conjunto de questões que se podem levantar: De que forma pode o cristianismo iluminar a vida deste povo? Que elementos da religião tradicional se podem integrar na fé cristã? Ou simplesmente, como evangelizar este povo religioso? A resposta a estas e outras questões seriam uma grande ajuda em todo o processo evangelizador. Porém, sei que para se conseguir uma resposta séria e satisfatória é preciso tempo e maior compreensão. Por isso, prossigo questionando e buscando respostas, mas acima de tudo deixando que seja o Espírito Santo a iluminar todo este caminho, a fazer ver as «Sementes do Verbo».

Raul Viana

26 - A alegria completa

– Netia-Itoculo/2003-2004 «Um homem não pode tomar nada como próprio, se isso não lhe for dado do Céu. […] Pois esta é a minha alegria! ...