23 de julho de 2017

O meu Bom Dia

Existem várias coisas que me fascinam aqui no povo Macua, algumas é um fascínio bom, outras é mais incredulidade, mas uma das coisas que mais gosto neles é o Bom Dia, aqui cada pessoa tem direito ao seu Bom Dia, não existe um Bom Dia geral, se passamos por 5 pessoas, devemos dizer 5 bons dias.


Se repararmos no simbolismo que isso representa nasce o fascínio, a admiração, nós somos suficientemente importantes para termos direito ao nosso bom dia, quantas vezes nos cruzamos com alguém que conhecemos e até o Bom dia nos custa a sair, perdemos o interesse e a motivação em nos aproximarmos do próximo, do outro, deixamos de ter tempo uns para os outros.

Aqui se há coisa que existe é tempo, tempo para estarmos uns com os outros. Se pela tarde formos passear pelos bairros, vamos perceber que os vizinhos estão nas varandas uns dos outros simplesmente sentados a conversar, só isto e isto já é tanto. Talvez a culpa desta disponibilidade seja a inexistência de Instagrams, de facebooks, de distrações que nos dão a ilusão de que temos uma vida social ativa.

A acompanhar o Bom dia vem o Iháli? (Tudo bem?) e esta pergunta vem com verdadeiro interesse em saber a resposta e quando retribuímos a pergunta respondem com tanta sinceridade, contando de verdade o que se passa na vida deles, que muitas vezes a resposta é desconcertante, está tão carregada de verdade que na maior parte das vezes não sei o que responder. Este pequeno gesto surpreende-me porque onde eu vivia há 6 meses atrás não havia tempo, nem disponibilidade, para verdadeiramente responder a esta pergunta, nem verdadeiro interesse na resposta que nos poderiam dar.

Pode parecer um clichê barato, mas aqui damos muito mais valor às coisas banais da vida, damos mais valor à companhia uns dos outros para contar as novidades mais corriqueiras do nosso dia, damos mais valor à vida, porque sabemos o que custa sobreviver, damos mais valor ao amigo, à família, porque o tempo custa a passar sem companhia.

10 de julho de 2017

PARABÉNS JUMA E ARGENTINA

A Paróquia de São José em Itoculo (Diocese de Nacala) começa a dar os primeiros frutos a nível da vocação para a Vida Consagrada. No dia 8 de Julho de 2017 dois jovens (Juma e Argentina) fizeram a sua Primeira Profissão Religiosa. Uma feliz coincidência na data e no compromisso religioso. Parabéns para estes dois jovens e votos de feliz e fiel caminhada na vida consagrada e missionária nas suas novas famílias religiosas.


O Juma Mário nasceu em Muthiapwa-Itoculo em 1988, fez a escola primária em Itoculo, continuou a escola secundária em Nacala-a-Velha, terminando em 2011 a 12ª classe. No ano seguinte entrou no Seminário dos Missionários da Consolata, primeiro em Nampula depois em Maputo onde estudou a Filosofia e fez o Postulantado. Em 2015 foi para o Quénia (Nairobi) onde estudou inglês e fez o Noviciado que terminou com a Profissão Religiosa no dia 8 de Julho de 2017. 

A Argentina Alfredo nasceu em 1990 em Itoculo sede, aí estudou o ensino primário, depois estudou na Escola Feminina de Nacala e na Ilha de Moçambique onde concluiu a 12ª classe em 2012. No ano seguinte entrou na comunidade das Irmãs Missionárias do Espírito Santo em Itoculo e depois foi para o Senegal fazer o Postulantado e aprender o francês. Em 2015 foi para França (Paris) fazer o noviciado que terminou com a Profissão Religiosa também no dia 8 de Julho de 2017.


Em 2009 quando cheguei a Itoculo estes dois jovens integravam o grupo dos vocacionados da paróquia. Acompanhei-os na etapa final antes de seguirem para cada uma das Congregações onde acabaram de Professar. É uma alegria ver o fruto que agora aparece e vai amadurecendo nesta grande árvore da Igreja de Itoculo-Nacala

Trata-se de uma semente que foi lançada á terra e agora começa a germinar. Outras sementes foram lançadas e estão em processo de gestação, e acreditamos que num futuro próximo também irão desabrochar. É o caso de um jovem (Vihene) que está a fazer o seu noviciado nos Franciscanos. Outros jovens estão a fazer o Postulantado e estudo da Filosofia nos Verbitas, nos Salvatorianos, nos Espiritanos e no Seminário Diocesano (12 rapazes), e uma menina está nas Irmãs da Apresentação de Maria.

A Paróquia de Itoculo conta actualmente com um jovem sacerdote diocesano (Pe. Bartolomeu) ordenado em 2008. Desde a criação da Paróquia em 2004, com uma Equipa Missionária residente (Padres, Irmãs, Jovens Estagiários e Leigos Voluntários Missionários), este tem sido um trabalho pastoral ao qual damos muita atenção e carinho. Trata-se, pois, do crescimento e estruturação de uma Igreja jovem que também está aberta a esta forma de vida e consagração. O exemplo destes dois jovens é uma afirmação clara que também irmãs e irmãos consagrados, sacerdotes e missionários podem desabrochar do seio das famílias cristãs de Itoculo. Assim, acreditamos que o exemplo destes primeiros compromissos religiosos vão ser sinal de luz e coragem para aqueles que estão nos Centros Vocacionais a fim de descobrirem a beleza e a alegria deste compromisso de vida.


Enfim, toda a Paróquia de Itoculo se alegra com estes jovens professos e deseja que, na fidelidade e total entrega a Deus e à Igreja, eles possam encontrar a verdadeira felicidade e fazer muitos outros ainda mais felizes pela sua consagração. Parabéns Juma e Argentina.

Ó Maria, Rainha das Missões, dai-nos muitas e santas vocações!

  

4 de julho de 2017

E PORQUE COM OS PÉS TAMBÉM SE REZA…

Este fim-de-semana, vivemos na nossa missão de Itoculo uma experiência maravilhosa de oração, sacrifício e de fé. Realizamos a nossa primeira peregrinação paroquial à comunidade de S. Paulo Monetaca (a primeira capela construída no território que é hoje a paróquia de Itoculo. Foi uma experiência linda fazer aquela caminhada com boa disposição contando e louvando a Deus.


Volvidos cerca de 3h30min estávamos em Monetaca para recuperar o fôlego e continuar com o nosso programa: oração de acolhimento, terço, cânticos e animação, história da comunidade contada pela voz dos mais velhos que a viram nascer. A experiência mais forte para mim foi o tempo de confissões (durante a noite), onde nós os 3 padres atendemos cerca de 500 pessoas que quiseram abraçar a misericórdia e o perdão de Deus através deste sacramento. Mesmo se as condições não garantiram grandes luxos, a noite deu para descansar minimamente e no dia seguinte as 6h00 tivemos a oração da manhã, seguida da Eucaristia às 7h00.

Depois de comer alguma coisinha, pusemos novamente os pés a caminho para os cerca de 20km de regresso a casa. O cansaço e as dores do caminho foram reais, mas a alegria que do coração transbordava não deixava indiferente os que nos cruzavam no caminho. A dureza do caminho foi assim vencida pela alegria, a fé, a confiança, a perseverança e muita oração; porque dos pés brotaram as melhores orações do fim-de-semana e os mais belos hinos de louvor ao Criador… porque com os pés também se reza.

1 de julho de 2017

FORMAR-SE PARA MELHOR FORMAR

A vida é uma escola, onde a morte se apresenta como a graduação. Esta parece ser uma realidade aceite e vivida por todos (principalmente os que já se graduaram). Ora, desde que cheguei a Itoculo, tenho feito esta mesma experiência de um modo intenso, alegre e desafiante. Um dos campos com que tenho contactado muito de perto tem sido o da educação, onde deparamos com alguns desafios e que tentamos dar respostas na nossa missão do dia-a-dia. Quero partilhar, neste pequeno texto, algum do nosso trabalho que acreditamos ser uma pequena contribuição para a construção de um Moçambique melhor e para a edificação de uma Igreja moçambicana que responde aos desafios actuais.
Desde 2009 que a nossa missão de Itoculo conta com um lar feminino que permite, permitiu e, esperamos, continuará a permitir que muitas jovens possam estudar pelo menos até à 10ª classe. Volvido poucos anos, tornou-se evidente a necessidade de alargar essa mesma oportunidade a rapazes que enfrentam os mesmos problemas. Este sonho nosso amadureceu e tornou-se realidade. Estamos a iniciar com o lar masculino que acolhe, este ano, 21 jovens estudantes entre a 8ª e a 10ª classe. Esperamos um número bastante superior a isso no próximo ano.
Esta situação constitui um desafio para mim que, juntamente com o Alexandre, procuro acompanhar estes jovens. Por um lado, apostamos em criar condições para debelar os deficits que possam existir ao nível académico, mas não se esgota aqui a nossa responsabilidade. Reconhecemos que para uma educação de qualidade, precisamos passar da simples instrução (conhecimento académico) para uma formação integral. Este é o nosso grande desafio pois exige-nos uma maior formação da nossa parte ao nível cognitivo, pedagógico, cultural, psicológico e social. Daí que cada dia tem sido para mim uma aprendizagem constante, ao mesmo tempo que vamos procurando incutir nestes nossos jovens os valores humanos, sociais, morais e religiosas (sem proselitismo), que acreditamos ser importantes para a construção de uma sociedade que seja cada dia melhor. A sociedade espera muito de nós e, por isso, todos esperam que os que estão nos lares da nossa missão estejam acima da média dos jovens que estudam aqui mas que estão por conta própria. Somos chamados a ser fermentos na sociedade. Grande responsabilidade a nossa!
Acreditamos que para isso uma educação de qualidade é indispensável. Por isso, sinto a necessidade de me manter sempre aberto para aprender com estes jovens que enriquecem em muito o meu conhecimento e a minha formação humana, cultural, moral, religiosa e académica (e aqui não se pode apoiar na máxima de que «burro velho não aprende caminho»). Esta realidade nos faz sentir vivos, pois constantemente em caminho e visto que os desafios existem para serem superadas, cada dia é, assim, feito de pequenas vitórias (ainda que algumas vezes acompanhada de algumas frustrações). … Assim podemos dizer estamos a fazer caminho!!!

Anima-me saber que procurar respostas para os desafios vale mais do que procurar os limites, pois só quem tem vontade de progredir e de participar no progresso, tem legitimidade para procurar as lacunas e falhas. Que Deus abençoe o pouco trabalho que vamos fazendo.

26 - A alegria completa

– Netia-Itoculo/2003-2004 «Um homem não pode tomar nada como próprio, se isso não lhe for dado do Céu. […] Pois esta é a minha alegria! ...