O dia começou com uma chamada telefónica do animador de
uma zona da paróquia a informar que muitas casas caíram com as chuvas que se
fizeram sentir esta semana. Dois dias antes o jovem de uma comunidade informava
que na sua comunidade caíram 35 casas. No dia seguinte rectificava e dizendo que
subiu para 78, e hoje confirmava serem 85 casas, com possibilidades de aumentar
nos próximos dias. Tudo isto resultou de um SMS enviado aos animadores para
recolherem os dados e trazerem para o Conselho Paroquial a realizar-se no final
do mês.
Após o mata-bicho, juntamente com o jovem Gilberto, seminarista
estagiário, demos uma volta pelos bairros, era a sua primeira incursão a fundo
por Itoculo. Cruzando pelo espaço da escola fomos na direcção do bairro Sanhote.
Encontramos o Sr. Bento que estava a sachar o milho num pequeno terreno junto
de casa, onde espera apanhar as primeiras massarocas para comer mais tarde.
Saudamos e seguimos rumo à casa do chefe do núcleo de Santa Isabel, que
encontramos quando regressava a casa com dois torrões de capim para
transplantar e resguardar a sua casa das águas da chuva. Uma planta que serve
também para afastar os mosquitos e dá um chã agradável para situações de indisposição.
Este encontro deu-se quando estávamos a saudar o
responsável da família da comunidade de São José, que estava a cortar um
cajueiro que caiu em cima da sua latrina. Entretanto chegou um jovem que ia
visitar um seminarista e combinar a viagem para Maputo. Também o seguimos nesta
visita quando vimos que estava uma conjuntivite há já duas semanas. Saudamos toda
a família e continuamos viagem, passando pela casa do Sr. Luís que estava de
cama. Entramos para saudar e desejar as melhoras, pois já tinha estado bastante
mal, pouco tempo atrás.
Por entre as casas do bairro seguimos até apanhar a
estrada principal. Aí encontramos três estudantes que também iam visitar o
colega que estava doente. Continuamos mais um pouco e cumprimentamos a mamã Lucinda
que estava com a sua criança recém-nascida, também ela com conjuntivite.
Descemos mais à frente saudando as pessoas e observando as várias casas caídas
ou em risco de cair. O nosso objectivo era chegar à casa do Ancião da comunidade,
mas ‘encontramos quando ele lá não estava’.
Na volta, tomamos o lado contrário da estrada e passamos pela
casa do Sr. Cássimo onde estava apenas a esposa com as crianças, lamentando-se
dos estragos que a chuva causou na cozinha e no celeiro. Continuamos viagem e
uma senhora nos interpela para saudar e dizer que está mal da garganta, mas, como
tinha entrado no hospital, conseguiu algum medicamento que vai tomar. Desejamos
as melhoras e seguimos até ao mercado pela estrada central. Passamos por um
grande cajueiro que tombou sobre uma casa e que agora estava cheio de crianças
penduradas como num baloiço e em forma de trapézio. Aquilo que era uma tragédia
para uns, para estes infantes começou a ser um centro de brincadeira e animação.
Talvez seja uma maneira alternativa e mais animada para olhar esta triste
realidade.
Daí cruzamos para o cemitério dos monhés que estava
fechado. Mais à frente entramos na zona do bairro Novo onde muitas casas também
sofreram com as chuvas intensas. De seguida penetramos no bairro de Talalane
passando por uma grande mangueira que estava a ser bem abanada nos seus frutos
ainda verdes. De tanto abanar se encheu todo o chão de mangas verdes, era a
fome e a vontade de apanhar mangas comestíveis. O pior é que amanhã não terão
outras mangas para comer, porque tudo ficou estragado no chão. Hoje apanham
algumas e amanhã não terão nada, apenas mais fome. Esta é a lógica da pobreza
que leva à miséria.
Sofrendo da real pobreza estava uma mamã que se aproximou
e nos pediu ajuda porque a sua casa caiu totalmente com as primeiras chuvas.
Sem ter onde ficar, abrigou-se provisoriamente na casa da filha. Uma situação
que se terá de prolongar no tempo, pois este não é período para novas
construções. Uma situação provisória por tempo indeterminado.
Continuamos e avançamos até ao núcleo de São Lucas, onde
estava o Sr. Paulo com os seus amigos sentados com sinais de quem está a tomar
uma ‘primeirinha’ (aguardente local). Também a sua casa foi danificada num dos
lados, mas a sala do núcleo estava intacta. Nada de pânico nem alarme, pois ‘Deus
enviará o sol para repor tudo no sítio certo’, dizia ele animado pelo espírito
da bebida. Aí encontramos também o jovem Okeya, conhecido de todos pela
insuficiência mental, mas muito calmo e simpático. Ele nos acompanhou e era o
centro das atenções até chegarmos a casa.
Enfim, foi uma volta rápida e atenta que ajudou a ver o
estado da situação provocado pelas chuvas intensas de uma depressão atmosférica
vindas do Canal de Moçambique. São muitos casos que precisam de uma acção
imediata da assistência do Governo local e central com activação do plano de
emergência, mas até agora pouco ou nada se fez. E tudo isto situa-se apenas em
Itoculo-sede, pois se considerarmos todos os bairros do Posto Administrativo,
certamente que iremos ultrapassar as 2500 famílias desabrigadas.
Como Igreja não temos recursos para socorrer estas
situações. Mas vamos pensar um plano que possa ajudar na reconstrução das
casas. Não apenas na aquisição de material, mas orientação para um tipo de
construção que minimize estas situações, onde prevaleçam as casas com cobertura
de quatro águas. Mesmo se a maioria das construções são precárias, com adobes
de barro amassado, também é possível que sendo bem-feitas elas possam suportar
estes fenómenos naturais, vencendo essa precariedade.
«Que Deus nos ajude e seja favorável». É isto que
queremos para este ano 2018, quando somos confrontados com situações
imprevistas e bastante danificadoras. Ao mesmo tempo, tudo isto representa para
nós um desafio à nossa capacidade rigorosa e eficaz de trabalhar. Estamos
vivos. Vamos em frente.
1 comentário:
Força e coragem para o povo de Itoculo, unidos em oração...
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