Estamos a viver, nesta
semana especial, o acontecimento maior da vida da Igreja. Tal nos convida a dar
passos cada vez maiores no nosso compromisso de fé. Cada ano a liturgia nos
propõe uma caminhada com Cristo para a morte e a ressurreição contínua. A semana
santa, com a sua riqueza incomensurável, nos mergulha com Cristo na sua morte
para, de modo tão admirável, nos fazer ressurgir para a vida nova no Espírito
Santo.
O tríduo pascal é sem
dúvida o ponto alto da semana santa e o culminar da caminhada quaresmal,
proposta pela sagrada liturgia romana. A vivência deste tempo forte, na nossa
realidade missionária, suscitou em mim esta reflexão que pretendo exteriorizar
neste texto em forma de uma partilha informal.
Durante estes dias,
entre momentos mais reflexivos e outros mais festivos, a imagem da cruz de
Nosso Senhor Jesus Cristo aparece, como nos apresenta São Paulo, como o centro
da vida cristã e do anúncio da salvação. E eu me pergunto: será que, numa
realidade onde o sofrimento e a dor nos entra pela vista adentro, continua a
ser pertinente o anúncio da cruz de Cristo? Ou ainda: num mundo onde cada vez mais
se tende a evitar, esconder e olhar para a dor, o sofrimento e a morte como
algo quase obsceno, ainda faz sentido um anúncio que leva como estandarte a
mensagem do Crucificado? Diante desta inquietação, só uma resposta me pareceu
plausível e adequada: hoje mais do que nunca o mundo precisa escutar esta
mensagem e aprender a lição da suprema doação materializada na Cruz de Cristo.
Se olharmos assim para
a nossa vida, certamente, a dor e a morte poderão também encontrar um lugar no
seio da nossa existência. Quando conseguimos integrar a morte e o sofrimento na
nossa vida e na nossa sociedade, mais facilmente compreenderemos que o único caminho
para viver bem e com dignidade não é a fuga, mas a doação. Abraçar a cruz de
Cristo é também passar pelo monte das Oliveiras e viver a noite da dor e da
solidão em atitude de esperança. O que torna a dor ainda mais insuportável é o
desespero e o sentimento do vazio: se não houver a esperança de que ainda resta
algo pelo qual eu posso lutar e que está ao meu alcance, a dor se torna
desumana e a eutanásia, o suicídio ou outras formas de «não-vida» se apresentam
como a única solução viável. Ora, em Cristo aprendemos que a morte não
significa «não-vida», mas também é um lugar onde Deus se manifesta. Será que no
mundo de hoje já não há lugar para esta mensagem? A nossa sociedade pode ser
privada deste anúncio? E se nos omitirmos a esta missão, quem pode levar esta
mensagem de vida aos Homens de hoje e de amanhã? Que neste tempo pascal cada um
de nós possa levar esta Cruz de Cristo gravada no nosso coração ao encontro dos
irmãos. A Páscoa nos convida, em cada ano, a olhar para a cruz e ver, não já o
instrumento de suplício, mas sim a árvore que produz frutos de vida divina. A
todos uma feliz e santa Páscoa, repleta das maiores bênçãos de Cristo o
cordeiro de Deus que nos salva do pecado.