18 de outubro de 2019

Eleições 2019


Abaixo segue-se uma carta de desagrado de um grupo de sete Observadores da Paróquia de Itoculo-Nacala pela forma como foram tratados nestas Eleições Gerais de 15 de Outubro de 2019.


MANIFESTO DE INDIGNAÇÃO

Nós, abaixo assinados, cidadãos moçambicanos do Posto Administrativo de Itoculo, Distrito de Monapo, estamos indignados e repudiamos a forma como fomos tratados enquanto candidatos a Observadores das Eleições Gerais do dia 15 de Outubro último. Fomos mobilizados pela Comissão Diocesana da Justiça e Paz de Nacala e remetidos à EISA-Solidariedade de Moçambique (Organização da Sociedade Civil com a missão de Observação Eleitoral) que junto da CNE solicitou os documentos necessários para nos creditar no serviço de Observadores Eleitorais.

Assim, uma vez aberta a campanha para a inscrição como Observadores das Eleições Gerais, cada um de nós preparou e apresentou todos os documentos e requisitos necessários para participar activa e responsavelmente neste acto cívico. Todas as despesas de documentação e viagens foram suportadas por nós mesmos, sendo que alguns de nós se distanciam a mais de 60km da sede distrital de Monapo, usando, para isso, meios de transporte muito dispendiosos.

Com o aproximar das Eleições sentimos que a pressão aumentava. Sexta-feira dia 11 de Outubro, 4 dias antes das Eleições, fomos convocados para uma formação onde nos foi atribuído um dossier/arquivo com as informações necessárias ao nosso trabalho de Observadores da Sociedade Civil. Aí permanecemos todo o dia e só à noite regressamos a casa. No dia seguinte, 12 de Outubro, ao final do dia recebemos nova informação para voltar à sede distrital para apanhar o restante material. Logo cedo, no domingo, nos encaminhamos para lá, e nos foi atribuído apenas o colete de Observador, dizendo para aguardar novas informações. Como somos do Posto Administrativo de Itoculo, alguns de nós sem qualquer familiar na vila distrital, tivemos de regressar à comunidade mais próxima de Itoculo e pedir socorro para ser alojado, isto depois de caminhar mais de 15km em pleno dia de sol intenso, por falta de meios económicos.

No dia 14 de manhã, de novo voltamos à sede do Distrito para receber novas informações e depois seguir para os locais de votação atribuídos. Porém, ficamos todo o dia à espera dos resultados, contactando com os responsáveis, sem nunca nos dar uma resposta exacta. Foi um dia inteiro à sombra de uma mangueira, sentados numa esteira, sem meios pessoais para aguentar a jornada, ficando à mercê da caridade de alguns amigos para comer e beber. Terminou o dia sem nenhuma informação, apenas nos diziam para esperar. O cansaço e o desgaste físico e psicológico eram muito notórios em todos nós.

No dia seguinte, 15 de Outubro, dia das Eleições, continuamos retidos por falta de informação para a entrega dos Crachás. Entretanto, pelas 10h nos atribuíram as Mesas de Voto onde poderíamos ser Observadores, e nos entregaram mil meticais em dinheiro e uma recarga de 200 meticais para comunicar. Um pouco mais tarde, insistiram connosco para seguirmos para os locais atribuídos sem os respectivos Crachás. Todos recusamos por haver documentação incompleta, mas acabamos cedendo sem saber que isso significava correr grande risco de vida podendo ser detidos por comportamento estranho numa área por nós desconhecida. Assim, pelas 13h saímos para os locais onde não fizemos nada do que nos competia como Observadores e fomos impedidos de votar.

Na verdade, aqui a nossa acção como Observadores resumiu-se a uma simples tarefa de comunicadores de factos externos, recolhidos sem qualquer controle, apenas apanhando as publicações de resultados para apresentar no dia seguinte, quarta-feira dia 16, aos nossos responsáveis da EISA que nos enviaram. Neste mesmo dia levamos essa informação e entregamos aos responsáveis que nos deviam devolver um valor de 3 mil meticais pelo trabalho efectuado, mas também não entregaram, fazendo apenas promessa para o dia seguinte. De novo, mais uma viagem de ida e volta, e no dia 17 ao final da manhã foram-nos entregues 3 mil meticais.

Assim, a nossa indignação vai para este procedimento dos responsáveis provinciais da CNE de Nampula por negar atribuir os Crachás e reter toda a informação até às 13h do dia da votação provocando um desgaste físico e psicológico de todos nós, deixando-nos condições sub-humanas, apenas aumentando o nosso sofrimento. Mas pior do que isto, estamos ainda mais indignados pela insistência desses responsáveis da EISA em nos enviar aos centros de eleição sem os devidos Crachás, o que levou a correr grandes e reais perigos de vida, movendo-nos às escondidas e com medo.

Estamos muito indignados porque não podemos exercer o nosso direito/dever de voto. Estamos indignados também porque fomos maltratados como pessoas nacionais pelas Autoridades Moçambicanas que nos deviam proteger. Estamos indignados porque sem qualquer intenção partidária, mas apenas querendo o bem do nosso País e as eleições justas, livres e transparentes, fomos renegados e considerados inúteis ao bem da nação. Estamos indignados porque gastamos inutilmente as nossas escassas economias aumentando a nossa pobreza. Estamos indignados porque fomos desrespeitados nos nossos direitos.

Estamos indignados com tudo isto e muito mais, mas não desistimos dos ideais que nos levam a trabalhar por um Moçambique diferente. Não vamos desistir nem abdicar daquilo que precisamos para o nosso País. Os nossos filhos merecem um País muito melhor e com Autoridades que respeitem aqueles que os elegeram. Acreditamos que amanhã será diferente. Por isso não vamos desistir, mas procurar juntar mais forças nacionais e internacionais para combater estes males da nossa sociedade e da nossa política desonesta.

Moçambique e os moçambicanos não merecem isto. Nós fomos grandes vítimas este ano. Como nós, também muitos outros irmãos nossos sofreram idêntica humilhação. Não podemos calar a nossa dor. Queremos a paz, queremos um Moçambique melhor.

Itoculo, aos 18 de Outubro de 2019.

Os cidadãos eleitores:
- Aminone Gabriel: nº 033169-29041914399 (033169-01/263)
- Atílio Francisco: nº 03169-050441807317 (03169-02/081)
- João Baptista Caetano: nº 03184-03051809539 (03184-02/701)
- Lucas Elias Paulo: nº 03181-22031808239 (03181-01/099)
- Minério Martelo: nº 03174-05041811449 (03174-02/249)
- Nito Manuel: nº 03169-05041811009 (03169-02/249)
- Silvano Ramete: nº 03178-08041807352 (03178-02/367)

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