Houve tempos, segundos antes da atuação do Covid19, em que
a internet, os media, os telemóveis
eram vistos como os culpados pelas mudanças pessoais, sociais e pela
desvalorização da moral e da ética, sobretudo na camada juvenil. Os jovens
foram vítimas da internet, pois passaram a ter comportamentos inadequados,
dizem os graúdos! É verdade, tenho constatado isso, sobretudo nas missas, mas,
muitas vezes, quando toca um telemóvel, digo a mim mesmo: é dos graúdos. E, na
verdade, quando dou uma espreitadela é um graúdo que vejo a mexer-se
atrapalhado a tentar desesperadamente desligar ou atender o seu telemóvel. São os
únicos momentos em que adivinho. O meu truque é o som das chamadas que é
qualquer coisa graúdo também. Mas o que mais me impressiona e, às vezes, me
irrita é a incapacidade dos graúdos de usar a razão, quando alguns, até a meio
da missa, atendem a chamada e falam tão baixinho que todos percebem que está
falando para Deus. Chegamos ao ponto em que desligar ou não atender uma chamada
é pecado. E o sacerdote, presidente, como é natural, fica incomodado, chateado,
de rosto desfigurado, e, oportunamente, aproveita a homilia para dar uma
descascadela na assembleia dos graúdos.
Primeira reviravolta: em várias assembleias, antes do sino
de entrada, pede-se para desligar os telemóveis ou pôr em modo de silêncio,
para não haver interferência com a santa missa. Acho bem e deve ser. Mas, hoje,
o cenário é outro, face a esta pandemia que obriga todos a ficar em casa, a
Igreja, na sua estratégia, para levar a palavra de Deus a todos, manda ligar a TV,
ligar o rádio, aceder à internet para ouvir, assistir, ou acompanhar a santa
missa; estes que outrora eram tidos como "inimigos". Belo dia, pego
no meu smartphone, ligo a net, abro o meu Facebook e a minha primeira reação:
"Olha, que engraçado! Estão a dar várias missas no Facebook, deixa-me
aproveitar já que não posso sair de casa para ir a igreja!” De facto, o meu
Facebook nunca esteve tão cristão como agora. Mas disse o Papa, na sua
audiência semanal, a 26 de fevereiro de 2020, Quarta-feira de Cinzas e no
início da Quaresma para católicos de rito latino: "É a hora certa de
desligar a televisão e abrir a Bíblia. É a hora de desconectar os celulares e
nos conectar ao Evangelho". Quando o impossível parece possível, concordo
com o Papa; missas on-line parecem-me mais uma sessão de cinema do que uma
celebração eucarística. Estamos de quarentena, vamos desligar tudo o que nos
prende aqui, e voltemos à igreja primitiva, pois, cada lar, cada família, é uma
igreja. Que mania de transmitir missas on-line!
Uma segunda reviravolta: depois do Covid19, há fortes perspetivas
de mudança de paradigma do mundo; umas dessas mudanças que, pela segunda vez,
vai surpreender a Igreja com uma reviravolta inesperada, a de que todos os
padres devem formar-se em comunicação social, uma vez que, depois de três meses
ou mais de quarentena, os fiéis vão habituar-se a missas on-line e, mesmo
acabando a quarentena, vão querer continuar com estas celebrações virtuais. A
oração é a única rede invisível, mas que é real, a que todos nós devemos
aceder, até porque é a única que nos pode garantir a comunhão, a ponte, com
Deus e entre todos nós. Hoje, as basílicas, as capelas, as sinagogas, as plataformas
digitais não nos servirão de nada, mas só e apenas a oração nos serve
perfeitamente; é sapato que tem todos os tamanhos disponíveis para os diferentes
tipos de pés dos cristãos.
Uma terceira reviravolta: houve tempos em que a Igreja
apelava ao abandono das zonas de conforto, isto é, deixar famílias, casa,
televisão, internet e ir às periferias; hoje a frase mais usada, mais lida em
todos os lados, da parte dos governos e da Igreja é: "fiquem em casa",
ou seja, não precisas de ir para a rua, ir à praia, a casa de um amigo, ao
trabalho; cria a tua zona de conforto em casa com a tua família! Que
reviravolta! Andamos assim, numa fase de desilusões; tudo que tínhamos dito ou
feito, antes do covid19, merece ser revisto, relido e repensado. Estamos a
viver um momento único na história e felizes somos nós que estamos a ver isso,
a ver o mundo parado, porque quando cantarmos isso aos nossos netos vão pensar
que é só mais uma lenda ou, na pior das hipóteses, uma história inventada pelo
avô, como ele já é graúdo!
Abraço fraterno do eleito...
GDB, La Remontada (A
Reviravolta)! 22.03.2020
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