Raul Viana
5. Razões da opção por Itoculo
Porquê que os Espiritanos deixaram
a Paróquia-Missão de Netia e vieram para Itoculo? De facto, como acabamos de
ver, durante vários anos os Espiritanos fizeram a viagem de Netia para Djipui
(Itoculo B), desde quinta-feira à noite ou sexta-feira de manhã até domingo.
Havia reuniões de formação e terminavam com a celebração eucarística dominical,
regressando depois a Netia. Mas à medida que o tempo avançava os Espiritanos
foram-se dando conta de que Netia era uma paróquia que oferecia boas garantias
não só ao nível de maturidade cristã do seu povo, mas também em termos de
sustentabilidade material… Por isso, com naturalidade, chegou-se à conclusão
que esta seria uma Paróquia a entregar ao clero diocesano.
Neste sentido, ainda em 1998, os espiritanos de Netia conceberam a hipótese de, num futuro a preparar, deixar Netia e assumir uma outra missão, no centro de Moçambique, que realmente necessitasse da presença missionária e que, ao mesmo tempo, permitisse aos espiritanos presentes em Moçambique concentrarem-se numa única região, uma vez que a exiguidade do número e a sua relativa fragilidade pareciam aconselhar essa concentração. Algum tempo de discernimento conduziu o Grupo num outro sentido: já que os espiritanos asseguravam, desde o princípio da sua presença no país, a cura pastoral de Itoculo B, que era uma área inteiramente necessitada de missionários e longe de poder ser entregue ao clero diocesano, faria todo o sentido que a atenção se concentrasse aí, deixando-se Netia, logo que pertinente, para o clero da diocese. Na verdade, logo à chegada os espiritanos tinham constatado que Netia, mesmo no entender do corpo missionário da diocese, seria a paróquia com melhores condições para confiar ao clero local. Entretanto, em 1996, ano da chegada dos espiritanos, o clero diocesano contava com um único sacerdote, que na altura estudava em Roma. Desde logo, portanto, os espiritanos assumiram como certo que, assim que as circunstâncias o aconselhassem, a melhor opção missionária seria deixar Netia.
Nos anos subsequentes o clero
diocesano foi aumentando lentamente. Nos inícios de 2000 era já possível
começar a vislumbrar um quadro de distribuição do clero local que incluísse a
paróquia de Netia. E foi nesse sentido que uma primeira proposta foi
apresentada a D. Germano Grachane, que a acolheu com muita abertura. Depois de
muito diálogo entre os espiritanos, os combonianos e a diocese, um primeiro
parecer positivo foi emitido pelo conselho presbiteral da diocese. Em 2002 um
acordo formal se estabeleceu, prevendo que em dois anos os espiritanos criassem
em Itoculo as condições necessárias para aí se estabelecerem. Foi ainda
previsto que, antes de deixarem Netia, uma equipa de padres diocesanos seria
nomeada e enviada para Netia, a fim de se assegurar um período de transição e
entrega da paróquia de Netia.
Embora durante todo o tempo em que assistiram Itoculo B o seu lugar de permanência fosse Djipui, os espiritanos decidiram que deveriam estabelecer o novo centro missionário no centro de Itoculo-sede. Tal permitiria um trabalho multifacetado, também na área da saúde e da educação, e possibilitaria também um melhor acesso ao exterior da paróquia, em todas as épocas do ano (embora nesta época a estrada entre Itoculo e a N8, que liga Nampula a Nacala, ainda não estivesse reabilitada e, por isso, ficasse por longos períodos intransitável ou quase). Depois de encontrado e adquirido o terreno, fez-se a prospeção de água; vários meses mais tarde, abriu-se um furo artesiano, em Outubro de 2002. Em Março de 2003, começaram as obras de construção da residência dos espiritanos. Em 8 de Março de 2004, os espiritanos deixaram Netia e estabeleceram-se definitivamente na casa recém-construída em Itoculo.
No início desse ano, tinha-se
também começado a construir a Casa dos leigos missionários, pensada para uma
equipa de três missionários leigos, dos quais, se possível, ao menos dois se
dedicassem à saúde e eventualmente um à educação.
6. A criação da paróquia de S. José de Itoculo
A Provisão dada por D. Germano Grachane a 22 de Fevereiro de 2004
(Nota: Provisão Registada no livro Competente sob
o nº 41-22-2-04 na Diocese de Nacala) faz saber que a quási-paróquia de Itoculo
manifesta bons «sinais de crescimento das
comunidades cristãs na fé adulta, operosa na caridade, na participação ativa
nas obras de evangelização, na qualidade e número de fiéis, de famílias
cristãs, de vocações à especial Consagração no sacerdócio e na vida religiosa».
O bispo continua afirmando que é «necessário
prover urgentemente ao melhor e maior proveito espiritual, moral e
humano-social» desta porção da Igreja diocesana. Assim, depois de «uma longa e atenta auscultação» das
autoridades eclesiásticas e civis, nos termos do Cânon 515 parágrafos 1-3,
Itoculo foi ereta em Paróquia autónoma.
Assim se lê na Provisão: «De hoje
em diante, o território de Itoculo fica definitivamente desmembrado da
jurisdição paroquial da Paróquia do Sagrado Coração de Jesus de Mweria, da
Paróquia de Nossa Senhora da Assunção de Netia e da Paróquia do Imaculado
Coração de Maria da Carapira, e o mesmo território passa a constituir paróquia
autónoma que se chama S. José de Itoculo. Os limites do território da nova
Paróquia de Itoculo coincidirão com os do foro civil, a saber: ao Norte, o
Distrito e a Paróquia de Nacarôa; ao Sul, o Distrito e a Paróquia do Mossuril e
parte do território da Sede do Distrito e Paróquia do Monapo e Paróquia do
Imaculado Coração de Maria da Carapira (do mesmo Distrito de Monapo); a
Nascente, o território do Distrito de Nacala-a-Velha e Paróquia do Sagrado
Coração de Jesus de Mweria (no mesmo Distrito); a Poente, o território da
localidade e Paróquia de Netia». Está dito ainda, «A nova Paróquia de Itoculo terá como
Padroeiro S. José, o casto e esposo da Santíssima Virgem Maria, cuja festa
litúrgica se celebra em toda a Igreja no dia 19 de Março, ao passo que a sua
sede paroquial ficará situada na Povoação que é a atual sede do Posto
Administrativo do mesmo nome, Itoculo».
No mesmo dia foi passada outra Provisão onde se faz saber a nomeação do Pároco para a recém-criada Paróquia de S. José de Itoculo, em ordem ao «crescimento espiritual e material dos fiéis e de todos os homens e mulheres de boa vontade». São então nomeados Párocos in Solidum o P. Pedro Fernandes (moderador), o P. Alberto Tchindemba, o P. Damasceno dos Reis e o P. Guilhermo Torres, todos espiritanos. Mais tarde, em Junho de 2009, com a mudança de pessoal missionário espiritano é nomeado pároco o P. Damasceno dos Reis, que continua até à data presente.
7. Vida e estruturas paroquiais e missionárias
Ereta canonicamente a Paróquia
de S. José de Itoculo a 19 de Março de 2004, dia do seu Padroeiro, S. José, as
denominações de Itoculo A e B deixaram de existir, passando a ser uma única
paróquia com três centros regionais: S. Pedro de Djipui, Nossa Senhora do
Rosário de Chihire e S. Carlos Luanga de Congo. Estas três regiões subdividem-se
em 15 zonas pastorais com 77 Comunidades cristãs, mais algumas salas de oração
e catequese.
Esta nova realidade
representou uma opção pastoral que resultou de um longo processo de
discernimento. Os espiritanos estavam cientes de que Itoculo A e B tinham
funcionado durante muito tempo como paróquias realmente autónomas. Desde que os
espiritanos tinham assumido a cura pastoral em Itoculo B, um estilo diferente
de animação se tinha também iniciado, o que tornava mais distante, entre as
duas “paróquias” o modo de conduzir a vida pastoral. Com a reunificação, um
novo desafio se colocava: caminhar para uma realidade paroquial una que,
respeitando as diversidades, correspondesse a um verdadeiro sentido de pertença
e identidade paroquiais. Desde cedo se promoveram encontros de diálogo e concertação
entre os conselhos paroquiais de Itoculo A e os conselhos regionais de Itoculo
B (Chihire e Djipwi). Um grande sentido de Igreja e uma visível boa vontade
marcaram a atitude de todas as partes, desde o princípio, o que tornou possível
que realidades pastorais bastantes díspares fossem, pouco a pouco, encontrando um
caminho comum e construindo em conjunto um projeto paroquial em que todos se
revissem. Este foi um período desafiante, cheio de aspetos sensíveis, mas de
grande riqueza para o crescimento e consolidação pastoral da nova paróquia de
S. José de Itoculo.
Mesmo a escolha do padroeiro
pretendeu apontar para uma figura que fosse por todos identificada como comum.
Assim, a figura de S. Carlos Luanga, padroeiro da quási-paróquia ereta nos anos
70, tinha-se de facto tornado o padroeiro da secção de Itoculo A; as figuras de
S. Pedro e de Nossa Senhora do Rosário eram percebidos como os padroeiros de
Djipui e Chihire. Para que o patrono paroquial fosse, como se pretende, fator
de unidade e coesão, a escolha de um novo santo padroeiro pareceu apropriada.
Sendo S. José patrono da comunidade de Itoculo-sede (Nacuca), e havendo já uma
devoção especial dos espiritanos de Netia por este santo (que até era o
padroeiro da comunidade espiritana), pareceu ser esta a figura que convinha à
nova realidade pastoral. A nova paróquia viria a ter S. José como seu patrono,
mantendo cada uma das suas regiões paroquiais com os seus padroeiros originais.
A paróquia conta com um Centro
Paroquial – S. Francisco Xavier – construído entre 2006 e 2007 com capacidade
para acolher 65 animadores. Trata-se de um Centro para formar e capacitar os
diferentes animadores de todos os ministérios existentes na paróquia. Este
Centro comporta também um espaço de culto para a comunidade local de S. José, e
esse mesmo espaço serve provisoriamente de «igreja paroquial». Além deste
centro paroquial, existe ainda outras construções de alvenaria e respetivo
terreno legalizado:
- Djipui: uma casa pequena (onde
pernoitavam os missionários vindos da Mueria, Carapira e Netia), uma capela e
duas salas de formação, mais uma cozinha e dispensa; a legalização do terreno
em 2012 comporta uma área de 12.942m2 (processo legal 3280/2011).
- Chihire: uma capela em
alvenaria juntamente com uma casa e cozinha (onde pernoitavam os missionários
vindos de Mueria e Carapira). Estes dois espaços foram recuperados em 2012, e
neste mesmo ano foi construído um salão e sala anexa para os encontros de formação;
a legalização do terreno em 2012 comporta uma área de 6.514m2 (processo
nº 3281/2011).
- Congo: uma capela em
alvenaria construída em 2001, um salão, dispensa e cozinha construídos em 2013;
a legalização do terreno em 2001 comporta uma área de 3.747m2 (processo
nº 281/96).
- Capela da comunidade de S.
Paulo Monetaca construída em alvenaria e alguns terrenos de outras comunidades
com documentos reconhecidos pelas autoridades locais.
Atualmente está em curso a
construção de um Centro de Estudos (Biblioteca e sala de informática) para
apoiar os estudantes da escola secundária. Igualmente faz parte deste projeto a
construção de um lar para estudantes, que a seu tempo aparecerá e se
apresentará como mais uma obra para apoiar a camada estudantil masculina com
maior dificuldade.
Além desta estrutura material, a paróquia conta sobretudo com a sua força viva, que são os seus cristãos (Nota: Os animadores regionais gerais de DJIPUI: Mauricio Ntavi (2002-2006); Ernesto Najope (2006-2012); Calisto Assuate (2012-). CHIHIRE: Acácio José (2000-2006); Júlio Obede (2006-2012); Cornélio Chanfar (2012-). CONGO: João Antique (2004-2010); Bernardo Adelino (2010-2011); António Salimo (2011-2014).) Neste sentido o quadro estatístico pode ajudar a compreender o ritmo atual da vivência e participação sacramental. Trata-se de um quadro que considera os bebés que foram batizados, bem como muitos catecúmenos jovens e adultos. Alguns destes últimos receberam também o Sacramento do Matrimónio. Tudo isto se pode ver melhor no quadro que apresenta estes números gerais desde a criação da Paróquia (19/03/2004) até ao fim de janeiro de 2014.
Relativamente ao Sacramento do
Crisma, durante estes 10 anos, por duas vezes o Sr. Bispo D. Germano Grachane visitou
a paróquia para ministrar este Sacramento (2005 com 175 crismandos e 2012 com
96 crismandos). Em 2004 o Crisma foi ministrado pelos PP. Pedro Fernandes e
Damasceno dos Reis mandatados pelo Bispo. Em 2008 veio o Vigário Geral da
Diocese, P. Firmino Cusini, mandatado pelo mesmo Bispo D. Germano. E em 2009 e
2011 o Crisma foi ministrado na unidade dos três Sacramentos da Iniciação
Cristã durante o Tempo Pascal, com 68 e 130 crismandos respetivamente. Ou seja,
um total de 1.219 jovens e adultos que foram crismados de 2004 a 2012.
8. A Consolidação da Paróquia-Missão
Após a criação da Paróquia, em
2005, chegaram as Irmãs Missionárias do Espírito Santo (Nota: As Irmãs que chegaram a Itoculo em 2005 foram: Ir.
Alice Areias (portuguesa: 2005-2009), Ir. Carmo Barros (portuguesa: 2005-2006).
Depois vieram a Ir. Felicité (centro-africana: 2006-2008); Ir. Adelaide
Teixeira (cabo-verdiana: 2006-); Ir. Joyce Abi (nigeriana: 2006-2012); Ir.
Augusta Vilas Boas (portuguesa: 2006-). Mais tarde chegou a Ir. Rosenir Soares
(brasileira: 2009-2012), e a Ir. Luísa Barros (cabo-verdiana: 2012-)
que, juntamente com os Missionários do Espírito Santo, formam a Equipa
Missionária com a tarefa de animar toda a paróquia nos seus diferentes
ministérios. Também parte integrante desta animação missionária são os
voluntários que chegam a Itoculo e dão o seu contributo profissional nas
diferentes áreas profissionais. Do mesmo modo, foi muito significativo a
presença e participação dos estagiários espiritanos que passaram por Itoculo
como já referimos atrás.
Na parte referente às Irmãs é
de salientar o trabalho de promoção feminina que se foi desenvolvendo, quer
pela formação geral das mulheres, quer pela costura e pelo Lar de acolhimento a
jovens estudantes que iniciou em 2010. Paralelamente, é muito significativo o
Centro Nutricional para crianças desnutridas inaugurado em 2009. Em 2013
iniciou-se um trabalho mais coordenado de apoio à infância com a criação do
centro pré-escolar «Baquita». Tudo isto além de muitas outras iniciativas de
caráter geral em vista do desenvolvimento integral da pessoa, especialmente da
mulher macua.
Uma das condições para ser
criada uma paróquia é a existência de sinais claros ao nível das vocações de
especial consagração ao Sacerdócio e Vida Religiosa. Assim, quatro anos após a
sua criação, a Paróquia de Itoculo celebrou efusivamente a Ordenação
Presbiteral de um dos seus membros, o jovem Bartolomeu Cipriano, da comunidade
cristã de S. Marcos-Carracane, foi Ordenado Sacerdote a 27 de Abril de 2008 em
Itoculo-Sede. Em 2012 iniciou o minicentro vocacional de Itoculo com a implantação
da Escola Secundária em Itoculo sede. Assim em 2014 a Paróquia conta com vários
jovens vocacionados e outros jovens em formação nos seminários e casas de
formação: 3 no Seminário diocesano de Nacuxa (Rapson Tarcisio, Bonifácio André
e Felisberto Mário); 3 nos Verbitas em Maputo (Albertino Raimundo, Adelito
Adriano e Abusai Adriano); 1 na Consolata em Maputo (Juma Mário); 2 nos Salvatorianos
em Maputo (Eunido Silvério e Ramos Francisco); 1 nos Franciscanos no Chimoio
(Vihene Munathapa); 1 nos Francelianos em Maputo (João Batista); 1 nos
Espiritanos (Magalhães Altino) ; e 2 jovens raparigas nas Irmãs Espiritanas em
Itoculo (Argentina Alfredo e Felismina Bento).
CONCLUSÃO
Esta é uma simples e familiar
apresentação da história da Igreja e da evangelização de Itoculo, onde muito
ficou por escrever. Primeiramente porque se trata de uma história recente ainda
carente de uma reflexão, e depois porque queremos que seja exposto, num ponto
seguinte, através de testemunhos escritos por cada uma das comunidades cristãs
que compõem a Paróquia.
Independentemente de tudo
isso, verifica-se uma trajetória evolutiva com um ritmo de vida e compromisso
cristãos a crescer de dia para dia. Este é também o dinamismo da atividade
missionária e evangelizadora da Igreja. Não obstante, estão a crescer também
muitas comunidades protestantes, algumas delas sem grande referência e
compromisso cristão. A par desta realidade, está a comunidade muçulmana que é
significativa e que juntamente com uma minoria da religião tradicional requerem
da parte da Igreja católica um espaço de abertura e diálogo religioso.
Pelo que fica exposto constata-se que a Paróquia foi criada canonicamente seguindo todos os trâmites necessários para tal. Porém, é interessante verificar que na data da sua criação não existia uma estrutura física que tornasse visível a sede paroquial. Além do documento escrito da criação da mesma, só a residência dos missionários dá esta marca local. Por sua vez isto é revelador do tipo de Igreja ministerial presente na Diocese e na Igreja em Moçambique, uma Igreja espalhada por pequenas e diversas comunidades. Porém, mais tarde, com a construção do Centro Paroquial, que incluía um espaço para uma ampla capela, adotou-se a mesma como «igreja paroquial» para eventos gerais da paróquia. Contudo, agora que passaram 10 anos de vida paroquial, talvez seja o momento de iniciar a construção de um espaço digno desta jovem Paróquia de S. José de Itoculo. Entretanto, a solidificação de uma igreja vai mais além das construções em alvenaria, para se centrar no rosto concreto de cada pessoa cada vez mais firme na fé. Acreditamos que o Espírito de Pentecostes continua vivo em cada um que se deixa iluminar e guir por Ele, de modo a procurar e se empenhar por uma nova e constante evangelização e transmissão da fé.