15 de fevereiro de 2021

11. «Abençoai-nos e santificai-nos»

 - Netia/1998

«Deus se compadeça de nós e nos dê a sua bênção, resplandeça sobre nós a luz do seu rosto… e chegue o seu temor aos confins da terra» (Sl 66,2.8)

Se o primeiro ano ficou marcado pelo assumir de novas responsabilidades pastorais nas dioceses, neste segundo ano começou a consolidação desses compromissos juntamente com algumas dificuldades de relação interpessoal, o que gerou, de alguma maneira, uma certa instabilidade na Missão e no Grupo Espiritano. Talvez por isso mesmo começou a ser preocupação a necessidade de uma terceira comunidade espiritana que fizesse a ponte entre as duas comunidades de Netia e Inhazónia, requerendo, para tal, novo pessoal e mais experiente na vida missionária.

Em Netia, no mês de Março chegaram duas Irmãs Ursulinas que visitaram Itoculo (Narrupe) para ver a possibilidade de uma nova comunidade religiosa na Diocese. Uma oportunidade para diminuir o isolamento de Itoculo e a necessidade de encontrar soluções para ultrapassar esta dura realidade, o que só aconteceu mais tarde com a chegada das Irmãs Espiritanas em 2005. Pois, quantas mais forças missionárias existem numa determinada área geográfica, mais possibilidades existem para responder com criatividade e dinamismo aos desafios da missão.

A nível de movimentações dos confrades, ressalta-se a viagem do P. Alberto de férias para Angola (20 de Abril a 23 de Julho), sendo uma boa parte do tempo para tratar da saúde essencial à vida missionária. Por sua vez, em Agosto, o P. Pedro foi participar como tradutor no Capítulo Geral de Maynooth (Irlanda). Entretanto, o P. Lawrence já tinha viajado o mês Março para o Zimbabwe e no mês de Julho foi fazer o seu retiro anual ao Malawi. Ainda em Agosto chegou a Netia, com a finalidade de visitar e descansar, o coordenador do Grupo Espiritano, o P. Benedito Cangeno.

A nível da paróquia de Netia, o Bispo Dom Germano fez uma curta vista pastoral nos dias 17 e 18 de Outubro, com celebrações de Crismas, que coincidiu com o dia mundial das missões. Um pouco mais tarde, no dia 1 de Novembro foi ordenado diácono o jovem Graciano Agostinho natural de Netia, fruto de sementeiras anteriores agora colhido pela comunidade espiritana.

Ainda é de ressaltar que no dia 22 de Novembro deu-se em Netia um grande afluxo de gente atacada pela cólera, o que fez com que o Posto de Saúde de Natete ficasse abarrotado sendo impressionante e doloroso ver a quantidade de pessoas a perder a vida por falta de soro fisiológico. A precariedade da vida era uma nota muito saliente no dia-a-dia das pessoas da missão de Netia, e de Moçambique em geral.

Enfim, este segundo ano da presença espiritana, bem como uma parte do ano anterior, ficou ainda marcado por inúmeras formações realizadas pelos confrades a nível da Diocese e nas Congregações Religiosas, com retiros e formações de noviças e postulantes. Concretamente, o P. Pedro e o P. Alberto multiplicaram-se nestes encontros formativos como forma de apoiar a Igreja local. 

PRECE: Hoje, Senhor, te pedimos a bênção para todas as pessoas que se cruzarem connosco e que a nossa vida seja um sinal da tua presença para todos eles. Faz de cada um de nós uma testemunha fiel do teu amor para vivermos intensamente a missão que nos confias aqui e agora. 

10. «Firmes na fé»

Grupo/1997

«Sede sóbrios e vigiai, pois o vosso adversário, o diabo, como um leão a rugir, anda a rondar-vos, procurando a quem devorar. Resisti-lhes firmes na fé» (1Pe 5,8-9)

Algumas contrariedades marcaram os começos da vida espiritana em Moçambique. Uma parte foram aquelas coisas simples de cada dia que exigiram um esforço conjunto de recuperação e organização logística e material. Outras coisas dizem respeito ao relacionamento e convivência entre pessoas que numa ou outra situação criaram grandes feridas e foram difíceis de superar. Mas tudo isso também fazia parte do novo projeto missionário em contexto de internacionalidade e de interculturalidade, onde era preciso estar unidos e resistir «firmes na fé».

Entre os imprevistos e dificuldades que aconteceram, sobressaem a chegada retardada do P. Lawrence, apenas no dia 13 de Janeiro de 1997 com dificuldade de obtenção de toda a documentação para entrar em Moçambique. Além disso a sua mala de viagem ficou perdida no aeroporto, sendo obrigado a seguir para Netia desprovido dos seus objectos pessoais mais necessários. Isto obrigou a novas e posteriores viagens a Nampula, mas não passou de imprevistos normais de quem viaja.

Outras contrariedades aconteceram e se repetiram inúmeras vezes, tais como as malárias em que o P. Alberto foi o primeiro a ser «carimbado» no dia 8 de Fevereiro de 1997. As condições de vida precárias, o alto índice de infeção parasitária da malária em Moçambique, os riscos de quem se adapta e ajusta à nova realidade missionária, entre outras coisas, foram factores que favoreceram inúmeras maleitas ao longo dos anos.

Vivendo ainda uma fase de adaptação, tudo se agravou um pouco mais quando o mesmo P. Alberto depois de ter participado na II Assembleia diocesana de Pastoral na Carapira-Nacala, precisamente no dia 17 de Outubro, foi vítima de uma hemorragia gástrica, uma úlcera rebentada no duodeno. Isto fez com que de imediato fosse levado para Nampula e daqui ter viajado para Maputo onde esteve numa clínica durante dez dias sempre acompanhado pelo P. Pedro. Não conseguindo qualquer resultado os dois continuaram viagem para Johannesburg (África do Sul) onde ficou internado durante oito dias, seguindo depois para a comunidade espiritana de Bethelehem, regressando a Netia apenas no dia 20 de Dezembro já recuperado.

Outro contratempo, em que já se fez referência, aconteceu em Maio de 1997, poucos meses após a chegada a Inhazónia, onde se deu a primeira baixa no Grupo, o P. Domingos Vitorino regressou definitivamente a Portugal. Na verdade, não faltaram momentos e diferentes situações de fraqueza humana e material que pôs em risco a missão espiritana em Moçambique. Interesses particulares, pontos de vista muito pessoais, sentimentos de incompreensão, pouca flexibilidade relacional, e outras coisas, apareceram e algumas vezes dominaram. Apesar de tudo isso a missão evangelizadora continuou e os sinais da presença de Deus nunca faltaram ao nosso lado para nos fazer avançar em frente e chegar onde era preciso chegar.

PRECE: Hoje, Senhor, te apresentamos todas as situações de fragilidade que marcam a nossa vida missionária. Ajuda-nos a enfrentá-las e a vivê-las com fé e sentido de esperança, de maneira a fazer de cada dificuldade um verdadeiro desafio de vida.

3 de fevereiro de 2021

9- Unidos no amor de Deus

- 1997

«Caríssimos, edificando-vos uns aos outros sobre o fundamento da vossa santíssima fé e orando ao Espírito Santo, mantende-vos no amor de Deus, esperando que a misericórdia de Nosso Senhor Jesus Cristo vos conceda a vida eterna. Tratai com misericórdia aqueles que vacilam». (Judas 1,20-22a)

Desde o princípio o projecto missionário dos Espiritanos em Moçambique estava sob a responsabilidade directa do Superior Geral e do seu Conselho. Uma e outra vez ecoaram pedidos de mais presença e proximidade para um maior apoio e animação. Assim, na segunda quinzena de Agosto de 1997 o Superior Geral, P. Pierre Schouver, visitou oficialmente o Grupo de Moçambique e aproveitou para participar no Primeiro Encontro do Grupo em Inhazónia de 20 a 27 de Agosto. Foi uma oportunidade para estar com os confrades e ver no terreno a melhor maneira de levar à frente a missão espiritana de Moçambique. Ao falar com cada confrade percebeu algumas dificuldades que deixou expressas numa carta escrita a partir de Maputo, quando regressava a Roma, onde concluiu que teve uma «impressão muito positiva» do Grupo.

Nesta carta endereçada aos confrades de Inhazónia (Benedito e Anthony) com uma cópia enviada para a comunidade de Netia, dando a entender que as mesmas recomendações são para ambas as comunidades espiritanas, ele partilhou as suas impressões gerais da visita a Moçambique e deixou algumas «exortações» para a vida missionária. Salientou, também, o esforço de aprendizagem da língua portuguesa e das línguas locais, a integração no trabalho eclesial e os arranjos nas respectivas residências. Um outro desafio apontado foi a constituição de «comunidades internacionais e interculturais» como uma verdadeira aventura missionária que é preciso «cuidar e construir» cada dia.

Apoiado nas palavras Jesus quando Pedro regressava da pesca com os seus colegas numa noite fracassada, insistiu que estas mesmas palavras se aplicam aos espiritanos de Moçambique: «volta a lançar as redes» (Lc 5,4). Ou seja, deixou um apelo para não desanimar nas tarefas de cada dia, mas confiar e ter coragem de arriscar de novo para «uma nova pesca». Acima de tudo foi uma forma de incutir mais esperança em quem estava um pouco desapontado com as dificuldades iniciais da missão em Moçambique.

E concluiu com três exortações bem práticas: «continuar os esforços para estar próximo do povo a quem foram enviados, com grande respeito pelos pobres, falando com eles na sua língua, estudando e tomando iniciativas sempre com eles; continuar os esforços de estar perto do Senhor através da oração diária pessoal e comunitária; continuar os esforços para viver juntos uma vida fraternal, tirando tempo para sentar juntos e comunicar entre si».

O apelo a edificar na fé e a manter-se firme no amor de Deus como forma de responder fiel e criativamente aos desafios da missão, foram as palavras e a presença amiga dos outros dois Superiores Gerais, Jean-Paul Hoch (Dezembro de 2010) e John Fogarty (Dezembro de 2019) que visitaram oficialmente o Grupo de Moçambique.

PRECE: Hoje, Senhor, te pedimos que nos envies o Espírito Santo para que nos mantenha unidos no amor de Deus através do serviço generoso e comprometido com os mais pobres, marcados pela misericórdia, a paz e a alegria de viver juntos como discípulos-missionários. 

8- «Servir e dar a vida»

- Inhazónia/1997

«Quem entre vós quiser fazer-se grande, seja o vosso servo; e quem no meio de vós quiser ser o primeiro, seja vosso servo. Também o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida para resgatar a multidão.» (Mt 20, 26-28)

Em todas as situações Jesus nos dá o exemplo de «servir e dar a vida» como forma de viver hoje a missão. Porém, nem sempre isso que acontece com os seus enviados. Os primeiros anos das comunidades espiritanas foram bastante desafiantes e difíceis, muitas coisas bonitas aconteceram, mas também não faltaram momentos sombrios no referente ao relacionamento e testemunho de vida dos seus membros.

No início da presença espiritana em Moçambique, Inhazónia foi a comunidade mais instável. Na verdade, a chegada dos Espiritanos a Inhazónia representou uma grande esperança para as comunidades locais. Uma vasta área de evangelização foi atribuída aos novos missionários. Muito trabalho pastoral foi realizado apesar das grandes dificuldades de coordenação e com um nível de vida comunitária muito longe do exemplo das primeiras comunidades cristãs narrada nos Actos dos Apóstolos. Aquilo que devia ser mais um elemento no processo de evangelização, «falar como quem tem autoridade» (cf. Mc 1,22), tornou-se muitas vezes um contra-testemunho.

As dificuldades de uma liderança impositiva, a falta de coordenação entre os seus membros, a inexistência de diálogo entre os agentes pastorais da missão, especialmente com as Irmãs da equipa missionária, entre outras coisas, parece que provocaram mais estragos que benefícios. Por isso não é de estranhar que o P. Domingos Vitorino pouco tempo depois da sua chegada a Inhazónia passou a viver na comunidade das Irmãs em Reparadoras do Sagrado Coração de Jesus em Catandica, regressando depois a Portugal definitivamente no mês de Maio de 1997. Entretanto, o seu coração ficou ligado a Inhazónia, pois logo que chegou procurou angariar fundos (11 mil USD) para a restauração da igreja paroquial que ia celebrar 50 anos em 1998.

Em Setembro de 1998 um grande desentendimento entre os dois confrades (Cangeno e Anthony) ficou agravado quando se insultaram em público. A vida de comunidade que devia ser libertadora, tornou-se um castigo e opressão. Por estas mesmas razões em Janeiro de 1999 o P. Cangeno toma a decisão de deixar a comunidade e o Grupo de Moçambique e regressar a Angola. Em Maio do mesmo ano chegou o P. Lawrence vindo de Netia para constituir comunidade com o P. Anthony na esperança de uma mudança significativa, o que resultou em parte.

Enfim, parece que os primeiros membros da comunidade espiritana poderiam ter sido bem melhores e mais razoáveis no referente ao compromisso missionário assumido com a missão de Inhazónia. Tudo isto também serviu para entender que a missão é obra de Deus e não dos homens, de contrário tudo teria acabado aí mesmo. Mas Deus não se deixa vencer em bondade e misericórdia, e novos caminhos de vida e missão começaram a surgir ao fim de poucos anos.

PRECE: Senhor, hoje, a nossa oração é para pedir perdão pela nossa incapacidade de serviço e comunhão. Perdoa todas as vezes que não sabemos liderar e conviver uns com os outros seguindo as tuas palavras que nos convidam ao serviço gratuito e à humildade sincera como forma de ser discípulo-missionário.  

7-«Fazer render os talentos»

- Netia/1997

«Um homem ao partir para fora chamou os servos e confiou-lhes os seus bens. A um deu cinco talentos, a outro dois e a outro um, a cada qual conforme a sua capacidade; e depois partiu». (Mt 25,14-15)

Em Netia este ano de 1997 ficou marcado principalmente pelos compromissos que se assumiram na diocese. Primeiramente a Paróquia de Nossa Senhora da Assunção de Netia e depois os sectores de Djipwi e Xihire da quasi-paróquia de Itoculo. Como na parábola do Evangelho, foram talentos recebidos para fazer render.

Tendo já sido apresentados aos cristãos da comunidade sede (Natete), no domingo 19 de Janeiro de 1997 os três padres subiram à montanha mais alta para apreciar o território da missão de Netia. Um pouco mais tarde, a 16 de Março, foi a tomada de posse da Paróquia de Netia com uma celebração presidida pelo Sr. Bispo e com a presença do Vigário Geral, P. Firmino Cusini. Nesta celebração foi nomeado o P. Alberto Tchindemba como Pároco em colaboração com o P. Pedro e o P. Lawrence. O Sr. Bispo mostrou-se satisfeito com a presença dos novos missionários com idade bastante jovem e convidou a comunidade paroquial a cultivar um espírito de generosidade missionária educando na fé os seus filhos, falando-lhes também da necessidade de sacerdotes, irmãs e irmãos.

Assim empossados, puderam celebrar nos dias 29 e 30 de Março a primeira Páscoa numa integração total com o povo macua, onde as celebrações foram muito animadas não faltando as batucadas durante toda a noite onde pernoitaram. Foram celebrações marcadas por muitos batismos, casamentos e primeiras comunhões.

Um outro acontecimento digno de registo foi a tomada de posse dos sectores de Djipwi e Xihire em Itoculo. Na verdade, pouco tempo após a chegada a Netia os espiritanos foram contactados para assumir estes dois sectores na área de Itoculo, um assunto que foi abordado na reunião comunitária de 3 de Março de 1997. Através do diálogo e da partilha a nível da Diocese tudo foi ganhando forma e nos dias 11 e 12 de Julho o P. Lawrence e o P. Alberto acompanham o P. Ambrósio e a Ir. Socorro e participam nos conselhos regionais de Xihire e Djipwi em vista de um melhor conhecimento da realidade. Foi uma primeira experiência de inserção onde tiveram de pernoitar «com muito frio, além dos rato e morcegos que tornaram o ambiente nocturno bastante pesado», redige o diarista.

Realizados todos os procedimentos necessários, a 20 de Julho fez-se a apresentação oficial dos sectores de Djipwi e Xihire e a quasi-paróquia de Itoculo B foi confiada aos espiritanos, ficando o P. Pedro como primeiro responsável, apesar de todos sentirem a obrigação de se envolverem visando criar um espírito de trabalho em equipa missionária. Neste dia a celebração da Missa foi presidida pelo Bispo D. Germano e congregou muitas pessoas na comunidade de São João de Deus em Reno.

PRECE: Hoje, Senhor, agradecemos todos os dons que Tu nos dás para o serviço dos irmãos. Faz de todos nós pessoas generosas e criativas para fazer render todos os dons que depositas gratuitamente em nossas mãos.

6- Presença de Deus

– Netia/1997

«Em verdade, em verdade vos digo: quem receber aquele que Eu enviar é a mim que recebe, e quem me recebe a mim, recebe aquele que me enviou». (Jo 13, 20)

Estas palavras de Jesus foram vividas intensamente pelos missionários que chegaram a Moçambique e a Netia em particular. Tanto os que foram enviados como aqueles que acolhiam souberam ser expressão desta presença de Deus, marcada pela hospitalidade e simplicidade elementos bem característicos do povo macua no norte de Moçambique.

A comunidade espiritana de Netia ficou completa com a chegada do P. Lawrence no dia 13 de Janeiro de 1997. Depois das boas-vindas e de uma visita geral aos espaços da missão, reuniu-se a comunidade espiritana pela primeira vez no dia 15 de Janeiro, onde se distribuíram as tarefas: P. Alberto como diarista, P. Pedro como ecónomo e, mais tarde, a 3 de Março foi nomeado interinamente o P. Lawrence como Superior.

Minimamente instalados, os primeiros momentos continuaram a ser dispensados na reabilitação da residência mas devido aos escassos recursos económicos as refeições continuaram a ser na casa das Irmãs combonianas, a eucaristia passou a ser celebrada na sacristia da igreja paroquial, o pedido de um carro novo tornou-se realidade, o equipamento da casa com eletrodomésticos básicos (frigorífico, ferro de engomar, espelhos nas casas de banho…) foi acontecendo, bem como a recuperação de outros espaços da missão... Entre outras coisas, foram estas as prioridades a ter em conta. Lentamente tudo se foi ajustando, e a 17 de Setembro chegou o carro, juntamente com a arca frigorífica a gás comprada pelo P. Pedro no mês de Agosto no Zimbabwe.

A primeira aula de macua tinha sido dada pelo professor Augusto, paroquiano de Netia, no último dia do ano de 1996. Mas de uma maneira mais formal e oficial, em plena semana pascal, no dia 1 de Abril teve início do curso de inculturação (cultura e língua macua) no centro Paulo VI - Anchilo onde participaram o P. Pedro e o P. Alberto. Por sua vez, o P. Lawrence preferiu ficar em casa por causa da sua dificuldade na língua portuguesa. Foram três meses de estudo e aprendizagem em vista de uma pastoral missionária inculturada.

Este primeiro ano ficou ainda marcado por várias visitas. A primeira visita estrangeira que chegou a Netia foi no dia 12 de Março, o jovem estagiário português Damasceno dos Reis vindo da Africa do Sul. Alguns meses depois, no início de Agosto, chegaram os Padres Gilles Pagès e Antóniio Ndjamba, dois missionários espiritanos vindos de Angola. Uma outra visita marcante deste ano foi o Superior Geral do Espiritanos, P. Pierre Schouver que chegou a Netia no dia 29 de Agosto para fortalecer o novo compromisso missionário. Um sentimento de comunhão e de encorajamento ficou bem expresso nestas visitas fraternas, também reforçadas por inúmeras visitas de âmbito diocesano e de outros missionários de Nampula.

PRECE: Hoje, Senhor, te pedimos por todas as pessoas que visitaram as nossas comunidades espiritanas, com longa ou curta duração, de mais longe ou de mais perto, mas que sempre foram um sinal da Tua presença no meio de nós. Ajuda-nos a estar sempre de portas abertas, em especial aos mais pobres.

5- «Profeta das nações»

 - Inhazónia/1996

«A palavra do Senhor foi-me dirigida nestes termos: “Antes de te haver formado no ventre materno, Eu já te conhecia; antes que saísses do seio de tua mãe, Eu te consagrei e te constituí profeta das nações”.» (Jr 1,4-5)

Os Espiritanos consagrados e escolhidos para Moçambique foram chegando a Maputo no mês de Novembro de 1996. E no final do mês, precisamente no dia 28, cada comunidade seguiu viagem para o seu destino. Os confrades de Inhazónia, Benedito, Vitorino e Anthony, viajaram ao final do dia com destino à Beira. Aqui pernoitaram e depois seguiram para Chimoio até chegar a Inhazónia.

A missão de Inhazónia está situada no distrito de Báruè, a 12km de Catandica que é a vila-sede do mesmo distrito, junto à estrada número 7 que liga Chimoio a Tete. Uma missão rodeada por montanhas laterais que alimentam o pequeno rio Mkulumpita que no tempo da chuva dificultava a passagem para a igreja paroquial e a residência. Estando situada numa zona rural, não falta terreno para produção hortícola e agropecuária.

À chegada dos Espiritanos a igreja e a residência paroquial construídas pelos Padres Brancos (Missionários de África) estavam bastante descuidadas devido à ausência de missionários residentes. A própria residência estava sendo usada como internato de rapazes, meninas e professores da escola primária. Também a escola e o centro de saúde, que eram da missão, foram tomados pelo Estado que usou e abusou dos espaços da missão, e foi grande a sua deterioração a todos os níveis, quer moral e quer materialmente falando. Recuperar o espaço da residência foi a primeira luta do Bispo Dom Silota, que tinha sido o último padre e pároco residente aí mesmo.

Entretanto, quando chegaram os três missionários espiritanos a Diocese fez um pequeno arranjo para acolher esta nova equipa, tendo sido montado um pequeno sistema de iluminação solar, e disponibilizado um carro Toyota Hi-lux para o serviço pastoral. Mesmo assim, os primeiros tempos foram dedicados a recuperar todos os espaços da missão, tornando-os minimamente habitáveis e disponíveis para o serviço da evangelização.

A Missão de Inhazónia celebrou as Bodas de Ouro (50 anos da paróquia) em 1998. Durante esse tempo a missão contou com a presença das Irmãs Reparadoras do Sagrado Coração de Jesus, que depois se instalaram em Catandica. Mais tarde, precisamente um ano antes dos Espiritanos, chegaram Irmãs Servas do Espirito Santo, que ao fim de quatro anos avançaram para Guru, onde se encontram atualmente. Por fim, chegaram as Irmãs do Sagrado Coração de Maria que fazem equipa missionária com os atuais Espiritanos.

PRECE: Hoje, Senhor, queremos pedir por todos os missionários que nos precederam no trabalho das missões onde iniciamos a nossa presença missionária. Muitos dos frutos que hoje colhemos foram semeados nesse tempo no meio de muitas dificuldades e também de muita confiança.

4-«O Senhor vai contigo»

 - Netia/1996

«Sê forte e valente! Não temas, nem te aterrorizes à vista deles. Pois, o Senhor, teu Deus, vai contigo; não te deixará sucumbir nem te abandonará!» (Dt 31,6)

Para a zona Norte a missão espiritana em Moçambique começou com a viagem de Maputo para Nampula, e depois até Netia, a qual teve a companhia do bispo de Nacala, D. Germano, para surpresa dos jovens padres Pedro e Alberto. Escreveu o diarista que «eram 17h quando começamos a ver as primeiras palhotas de Netia», onde as Irmãs combonianas e um grupo de cristãos fizeram «um acolhimento caloroso», ficando ainda a impressão de ter chegado num «lugar calmo, isolado e acolhedor, mas bastante quente».

Os primeiros dias foram ocupados em tornar a casa mais habitável, na parte da água e energia, pois havia vários anos que estava desabitada. Valeu acima de tudo a hospitalidade das irmãs combonianas que supriram muitas carências materiais. Mas a missão não era para ficar em casa, e nesse dia à tarde houve um encontro de anciãos onde foram apresentados os dois novos missionários. O mesmo acontece no dia seguinte com as celebrações do primeiro Domingo de Advento nas comunidades locais, feitas em português e que ninguém entendia, mas deu logo para perceber que a língua macua era o primeiro desafio a agarrar.

Nos dias seguintes o P. Alberto e P. Pedro deram uma volta pela Diocese começando por Nacala, no Paço Episcopal, de onde partiram com o Sr. Bispo para um banho nas águas calmas do oceano índico, seguindo-se depois uma viagem à Carapira com paragem em Mweravale, onde estavam os combonianos junto do memorial do Ir. Fiorino e a Ir. Maria mortos na guerra civil. De novo em Nacala visitaram Sto. Agostinho e S. João Batista, e no dia 8 de Dezembro participaram na celebração eucarística na Catedral onde foram apresentados. O processo de inculturação continuou com a visita à missão de Mueria, a missão-mãe de Netia, e no dia 12 de Dezembro seguiram até Nacaroa, passando depois por Alua, Namapa até Mirrote, onde se pronunciaram as primeiras palavras em macua «mphaka melo».

No dia 18 de Dezembro regressaram definitivamente a Netia. Na antevéspera de Natal houve ainda um dia de recolecção com as Irmãs e no dia 24 de manhã levaram o Santíssimo às comunidades para a grande celebração de Natal. À noite celebraram o primeiro Natal em Moçambique, «foi uma beleza ver o povo a cantar e dançar ao som do batuque» ficando o regresso a casa depois da meia-noite. E o dia seguinte continuou com o mesmo ritmo festivo.

PRECE: Hoje, Senhor, queremos rezar por todos os missionários que iniciam novos projetos de missão. Dá-lhes força e coragem para suportar todas as vicissitudes do dia-a-dia, e com plena confiança na Tua presença que vence todos os obstáculos, enche-os da tua graça divina e livra-os de todo o mal.

3-«IDE E ENSINAI»

- ano 1996

«Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos, baptizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a cumprir tudo quanto vos tenho mandado. E sabei que Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos». (Mt 28, 19-20)

Os 25 Anos da missão espiritana em Moçambique começam efectivamente no dia 28 de Novembro de 1996 com rostos concretos e destinos definidos para uma missão plural e desafiante, em resposta ao mandato missionário de Jesus. Trata-se de uma data que marca o início de uma missão ao serviço de uma Igreja jovem e cheia de dinamismo, num país que acabava de sair de uma longa guerra civil que ceifou muitas vidas inocentes.

Os confrades Pedro Fernandes (português), Lawrence Nwaneri (nigeriano) e Alberto Tchindemba (angolano) avançaram para a paróquia de Nossa Senhora de Assunção - Netia, diocese de Nacala, dedicando-se à assistência espiritual das suas vastas comunidades ministeriais e também dos sectores de Djipui e Xihire da futura paróquia de Itoculo. Os três jovens padres davam continuidade ao trabalho pastoral iniciado pelos missionários combonianos em 1962 visando ajudar o povo a «andar com os seus próprios pés». Um estilo de Igreja constituída em pequenas comunidades ministeriais marcava a pastoral desta comunidade missionária.

Por seu lado, os confrades Benedito Cangueno (angolano), Domingos Vitorino (português) e Anthony Ahamba (nigeriano) partem para a paróquia de S. Paulo do Bàrué - Inyazónia, diocese de Chimoio, ocupando-se da cura pastoral de quatro distritos (Bàrué, Guru, Macossa e Tambara) que correspondia a metade da Diocese de Chimoio. Tratava-se de uma missão de primeira evangelização, onde há 25 anos a população não tinha missionários residentes. As grandes viagens ao encontro do povo para a animação espiritual das comunidades e a formação dos responsáveis das pequenas comunidades cristãs marcaram o dia-a-dia dos confrades.

Duas frentes de missão foram retomadas para revigorar a vida das comunidades cristãs nestas duas jovens Dioceses de Moçambique. Grandes desafios marcaram o início desta presença missionária, concretamente o encontro de culturas e o tipo de igreja ministerial, a internacionalidade das comunidades espiritanas e a grande distância geográfica entre elas. Porém, tudo isto foi possível ultrapassar graças à confiança nas palavras do Mestre: «Eu estarei sempre convosco». Uma presença sentida, principalmente, nos momentos de maior dificuldade.

PRECE: Hoje, Senhor, queremos rezar pelos missionários espiritanos da primeira hora em Moçambique, ajuda-os a continuarem fiéis à sua vocação missionária onde quer que se encontrem, e que este aniversário jubilar reforce o seu compromisso missionário.

2- «EIS-ME AQUI, ENVIA-ME»

 - ano 1995

«Então, ouvi a voz do Senhor que dizia: «Quem enviarei? Quem será o nosso mensageiro?» Então eu disse: «Eis-me aqui, envia-me.» (Is 6,8)

A missão espiritana em Moçambique começou com um «sim» afirmativo ao pedido de dois bispos moçambicanos, como duas sementes lançadas à terra missionária de Nacala e Chimoio.

Dom Francisco Silota, bispo do Chimoio, conhecendo os espiritanos de Mutare (Zimbabwe) tudo fez para ter uma comunidade espiritana para a sua diocese. Apresentou oficialmente o pedido ao Superior Geral numa visita a Roma (1994), o qual foi acompanhado por Dom Germano Grachane, bispo de Nacala, que também precisava de missionários, pois eram duas dioceses recém-fundadas. 

Os pedidos foram levados ao Conselho Geral Alargado de Dakar (1995) que analisou e aprovou visto corresponderem ao carisma espiritano de primeira evangelização e apoio às Igrejas com dificuldades de obreiros. Decidiu-se então que o pessoal para a abertura das duas comunidades espiritanas ficava à responsabilidade das Províncias espiritanas de Angola, Nigéria e Portugal.

Num primeiro momento os padres Jerónimo Cahinga, Provincial de Angola, e José Manuel Sabença, em representação do Superior da Fundação Centro-Sul de África (SCAF) na África do Sul, fizeram uma visita às referidas dioceses e deram o seu parecer favorável e a pertinência de uma verdadeira inserção missionária. Depois o P. Benedito Cangueno que, tendo visitado também as duas dioceses e, baseando-se nos relatórios anteriores, acabou por escolher as paróquias de Inyazónia (Chimoio) e de Netia (Nacala) para iniciar a missão espiritana em Moçambique.

Uma vez escolhidos os lugares e com o pessoal já nomeado por cada uma das Províncias espiritanas, foi organizado um encontro de toda a equipa em Lisboa no mês de Setembro de 1996, coordenado pelo P. Bernardo Bongo. Embora faltasse o P. Anthony Ahamba, foram formadas as duas comunidades na presença do P. James Divine, Superior da SCAF, que assim incluía o Grupo de Moçambique como membro da Fundação juntamente com a África do Sul, Malawi, Zâmbia e Zimbabwe.

PRECE: Hoje, Senhor, te pedimos por todas as Igrejas cristãs com falta de pessoal missionário, por todos os que planeiam e sonham uma Igreja bem estruturada, por todos os que se esforçam por construir uma «Igreja em saída», por todos os que são solidários e dizem com coragem: «Eis-me aqui, envia-me!».

1-«CHAMEI-TE POR CAUSA DA JUSTIÇA»

 «Eu, o Senhor, chamei-te por causa da justiça,segurei-te pela mão; formei-te e designei-te como aliança de um povo e luz das nações; para abrires os olhos aos cegos, para tirares do cárcere os prisioneiros, e da prisão, os que vivem nas trevas». (Is 42, 6-7)

Os 25 Anos da chegada e presença missionária espiritana em Moçambique foram antecedidos de alguns sinais e apelos que se concretizaram apenas a 28 de Novembro de 1996. Tratava-se de um chamamento que se fez ouvir «por causa da justiça».

Assim, o primeiro pedido para uma presença espiritana em Moçambique é uma carta de Dom Manuel Vieira Pinto, bispo de Nampula, de 1969, poucos anos depois de ter chegado à sua diocese e de se ter confrontado com a imensidão do território sem assistência pastoral. Então redigiu uma carta ao Superior Provincial de Portugal, P. Amadeu Martins, dizendo: «Venho confiadamente pedir a colaboração missionária dos Padres do Espírito Santo. (…) Sei que a hora é de crise e de penúria; no entanto, estou certo que devemos fazer um milagre para bem da Igreja em Nampula e para bem da Vossa Congregação, pois deve estar presente em Moçambique…». (Carta de D. Manuel Vieira Pinto, Bispo de Nampula, 12.02.1969)

O padre Amadeu Martins acusa a recepção da carta e manifesta o desejo de «corresponder ao apelo angustiante» de D. Manuel. Porém, a vastidão da missão que lhe está confiada e o reduzido número de pessoal missionário não permitem uma resposta positiva. No entanto, disponibiliza-se para apresentar o mesmo pedido ao Superior Geral da Congregação, pois dele depende a aceitação de um novo campo de apostolado. (Cf. Carta do P. Amadeu Martins, Superior da Província Portuguesa da Congregação do Espírito Santo, 27.02.1969).

Pouco anos depois, em 1976, justamente um ano depois a Independência, Dom Luís Gonzaga, Bispo de Lichinga, escreve ao Conselho Geral, pedindo missionários para a sua vastíssima diocese desprovida de assistência espiritual. Acerca deste pedido não dispomos da carta oficial, nem da resposta do Conselho Geral. Provavelmente, como no caso anterior, prevaleceu a dificuldade de falta de pessoal disponível para responder ao apelo do bispo.

Estes são alguns antecedentes da chegada dos espiritanos a Moçambique. Uma história pequena mas que vem de longe…

PRECE: Hoje rezamos por todos, vivos e defuntos, responsáveis diretos e adjuntos, bispos, superiores, secretários… todos aqueles que, de uma maneira ou outra, procuraram a Congregação do Espírito Santo como resposta às suas preocupações pastorais e espirituais em Moçambique.

26 - A alegria completa

– Netia-Itoculo/2003-2004 «Um homem não pode tomar nada como próprio, se isso não lhe for dado do Céu. […] Pois esta é a minha alegria! ...